Para os leigos, o trabalho com Arte na educação pode muitas vezes ser confundido com aulas sobre técnicas e o estudo das diferentes escolas estéticas. Essa é, porém, uma visão limitada e empobrecida do ensino de Artes. A expressão artística é marcada pela liberdade, pela inexistência de fronteiras, pela criatividade e pela experiência da beleza.
A proposta de Arte do Projeto Ciranda foi preparada pelos arte-educadores Pascoal Ferrari e Solange Utuari, pesquisadores, autores de materiais pedagógicos e professores de Arte do Ensino Superior (na Universidade Cruzeiro do Sul).
Nesta entrevista, Pascoal Ferrari fala do peso do eixo da Arte no Projeto Ciranda.
No Projeto Ciranda, Arte está no mesmo nível dos demais eixos?
Pascoal Ferrari – Sem dúvida. Na Educação Infantil, em especial, o trabalho com Arte é fundamental, pela sua importância para o desenvolvimento da criança. A infância é caracterizada pela exploração do mundo, pela imaginação, pela ludicidade, pelo faz de conta. A Arte é uma linguagem de grande riqueza, que permite às crianças aprender e construir conceitos pelo perceber, pelo sentir, pelo refletir, pelo imaginar. Por meio da Arte, desenvolvemos um olhar mais sensível sobre o mundo, aprendemos a ver a realidade de uma forma mais crítica, com senso estético, e isso interfere na formação global do cidadão. Partimos do princípio de que a Arte é um direito do ser humano, tanto do ponto de vista do fazer artístico como do ponto de vista da apreciação artística.
As crianças trabalham com outras formas de expressão, além do desenho?
Pascoal Ferrari – Sim. A proposta passa por todas as linguagens artísticas: pintura, desenho, teatro, teatro de sombras, fotografia, escultura, dança, música. Essa riqueza de estímulos sensoriais passa a fazer parte do repertório das crianças, que utilizam a visão, a fala, a audição. A questão corporal, por exemplo, é muito importante. A partir das artes cênicas conseguimos ter um contato mais próximo com o corpo do outro e com o nosso próprio corpo. Isso é fundamental para o desenvolvimento sadio.
Existe o preconceito segundo o qual a Arte é uma questão de dom. Isso é verdade?
Pascoal Ferrari – Claro que não. Toda criança, aliás, todas as pessoas são capazes de aprender a se expressar por meio da Arte. Evidentemente, com crianças, partimos de uma abordagem mais livre, de expressão e exploração, que não se preocupa prematuramente com as técnicas. Os alunos tomam contato com os materiais, produzem suas próprias tintas e os recursos com os quais vão criar. A Arte é uma linguagem que permite à criança experimentar o faz de conta, o brincar, que também é seu direito assegurado.
Como as famílias e as crianças vêm recebendo a proposta de Arte do Ciranda?
Pascoal Ferrari – Muito bem. O material como um todo tem um impacto muito positivo. Pelos relatos que ouvimos, sabemos que as famílias percebem o envolvimento da criança, a felicidade delas quando desenvolvem as atividades, como elas constroem o conhecimento. A maioria dos pais reconhecem a importância da Arte, também. O interesse vem crescendo no Brasil, de forma clara. Basta ver as bienais, que estão sempre lotadas.
E os professores?
Pascoal Ferrari – Os professores também recebem tudo muito bem. Cabe lembrar que há uma formação específica para que os educadores trabalhem com o material. A expressão livre não significa um vale-tudo. Há uma abordagem teórica e uma metodologia precisa nesse trabalho, que parte de conceitos como nutrição estética, resumidamente a apreciação mediada de produções artísticas pelas crianças, e territórios da Arte. As crianças aprendem a perceber no mundo ao seu redor formas, cores, linhas, sons que incorporam em sua linguagem expressiva.